Observatório
10
min leitura

A situação de urgência humanitária na Grécia

Publicado a
19/3/2020

A crise humanitária nos campos de refugiados na Grécia tem-se agravado nas últimas semanas. A complexidade da situação exige uma leitura atenta dos factos para tentarmos compreender a posição dos diferentes intervenientes. Esta complexidade não retira qualquer urgência à situação, nem pode legitimar nenhuma violação da dignidade da pessoa humana.

— O New York Times denunciou a existência de um centro de detenção “secreto” onde diversos migrantes dizem ter sido alvo de tratamento desumano. Nas entrevistas, os migrantes relatam que foram capturados, espancados e expulsos do território grego sem ter a oportunidade de pedir asilo ou falar com um advogado. O Governo da Grécia nega a existência do centro acusando as notícias de propaganda turca contra o estado grego.

Tyler Hicks para The New York Times
Tyler Hicks para The New York Times

— Na fronteira terrestre do norte da Grécia com a Turquia, Mohammed Yaarub, um sírio de 22 anos de Alepo que tentou cruzar a fronteira foi morto por tiroteio. O governo grego rejeitou esta morte como “notícias falsas” e negou que alguém tenha morrido na fronteira. No entanto, uma análise de vídeos e de entrevistas com testemunhas confirmou que Yaarub foi morto na manhã de 2 de março, na margem oeste do rio Evros.

— No dia 2 de março, um navio da Guarda Costeira Grega repeliu violentamente um bote insuflável lotado de migrantes. As imagens mostram disparos nas águas perto do bote insuflável, antes de empurrarem e atingirem o bote com bastões. O incidente foi divulgado pelas autoridades turcas.

— Dias depois, um vídeo filmado pelo The New York Times mostra, a 7 de março, a polícia turca a disparar gás lacrimogêneo na direção das forças de segurança gregas, enquanto os migrantes tentavam desmontar o arame farpado da cerca da fronteira.

Sedat Suna para a EPA
Sedat Suna para a EPA

— A 7 de março, um incêndio de grandes dimensões destruiu o centro social de refugiados “One Happy Family”, um importante ponto de encontro e centro de apoio para os refugiados dos campos de Moria e de Kara Tepe, em Lesbos. As causas do incêndio ainda são desconhecidas, mas há indícios de se tratar de fogo posto.

— A 9 de março, mais de 250 voluntários humanitários portugueses enviaram uma carta ao Presidente da República e ao Governo Português, pedindo ao governo para cumprir o Acordo Bilateral com a Grécia, celebrado em 2019, mas até agora não efetivado, em que se disponibilizou a acolher 1000 pessoas que se encontram em campos de refugiados gregos.

— No mesmo dia, a presidente da Comissão Europeia anunciou que 5 Estados-membros da UE, entre os quais Portugal, atenderam ao pedido de ajuda imediata para acolher menores desacompanhados que se encontram nos campos de refugiados na Grécia. Calcula-se que o número de menores nos campos de refugiados da Grécia seja à volta de 5500.

— Esta semana, uma criança morreu num incêndio num dos contentores no campo de refugiados de Moria, em Lesbos.

Maurício Lima para o The New York Times
Maurício Lima para o The New York Times

— Com a evolução do surto Covid-19 a nível mundial e a confirmação de um caso positivo de um cidadão grego na ilha de Lesbos, os Médicos Sem Fronteiras apelaram à evacuação imediata dos migrantes dos campos de refugiados das ilhas gregas devido ao alto risco de contágio e propagação do vírus.

— As medidas recomendadas para impedir a propagação do vírus (lavar as mãos frequentemente; manter distanciamento social) são impossíveis quando nos campos os relatos são de 1 torneira para cada 1300 pessoas e famílias de 5 ou 6 pessoas a dormir em espaços de menos de 3 m2 .

— Nos últimos dias, o governo grego adotou como medidas preventivas da propagação do Covid-19, a suspensão das visitas e atividades de todas as ONGs dentro dos campos por duas semanas e suspendeu os seus serviços de asilo até 10 de abril.

— Nas imediações do campo de refugiados da ilha de Lesbos,um grupo de mulheres afegãs estão com a Stand By Me Lesvos a cozer máscaras destinadas às pessoas que vivem no campo. As crianças no centro juvenil da Still I Rise, no campo de Samos, têm produzido posters sobre lavar as mãos e outras medidas de higiene de prevenção do Covid-19.

— Depois do alerta da MSF, a Plataforma de Apoio aos Refugiados pediu ao Governo Português a aplicação efetiva do Acordo Bilateral Portugal-Grécia, colaborando com urgência e em coordenação com as instituições europeias, num plano de contingência médica e na evacuação dos campos nas ilhas.

As condições deploráveis a que estão sujeitos, as tensões crescentes vindas de alguns movimentos organizados e a retirada de várias ONGs do terreno, colocam os migrantes que procuram refúgio e asilo na Grécia, numa situação extremamente vulnerável, desde 2015.

_____

18 de Março de 2020

📸: As fotografias são de Maurício Lima para o The New York Times, Aris Messinis para a Getty Images, Lia Marcou para a Reuters e Sedaq Suna para a EPA]

🌐 Fontes:

NGOs raise alarm as coronavirus strips support from EU refugees

No Soap, Little Water, and No Way Out: Refugee Camps Brace for Coronavirus

MSF urges Greece to evacuate migrant camps due to coronavirus risk

Child killed in Lesbos refugee camp fire | World news

Lesbos coronavirus case sparks fears for refugee camp

Grécia nega existência de centro de detenção “secreto” onde os migrantes são tratados “como animais”

‘We Are Like Animals’: Inside Greece’s Secret Site for Migrants

Cinco países da UE vão acolher menores desacompanhados dos campos de refugiados gregos. Portugal é um deles

Incêndio destrói centro social de refugiados em Lesbos

Incêndio destrói centro social de refugiados em Lesbos

Mais de 200 voluntários pedem a Portugal que receba os refugiados que vivem sem condições nos campos da Grécia

Autores
Pedro Amaro Santos
Autor
Isabel Martins da Silva
Autor
Subscreve a nossa newsletter
Ao subscreveres, concordas com a nossa Política de Privacidade e dás o teu consentimento para receberes notícias sobre a MEERU.
Partilha