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A maior onda migratória na América Latina: VENEZUELA

Publicado a
20/7/2021

No final de 2020, dos 82 milhões de pessoas deslocadas forçadamente em todo o mundo, 5,4 milhões eram venezuelanos empurrados, maioritariamente, para os países vizinhos, mas também para outras zonas do planeta.

— O contexto político e socio-económico da Venezuela tem dado origem ao maior movimento migratório na história da América Latina. Desde 2014, houve um aumento de 8000% no número de venezuelanos que fogem da violência, ameaças, falta de segurança e de acesso a comida, medicamentos e serviços essenciais. Muitas partem a pé — fazendo milhares de quilómetros por rotas perigosas — para outros países sul americanos; outros tantos fogem sem saber o seu destino. E se alguns deixam para trás a família, outros tentam reunir-se novamente com as suas.

— Os países vizinhos abriram as suas fronteiras e, neste momento, a América Latina enfrenta um cenário de deslocações forçadas sem precedentes, acolhendo cerca de 20% das pessoas deslocadas em todo o mundo. Apesar dos esforços para promover a regularização da situação legal destas pessoas, grande parte continua sem documentos ou autorização para permanecer nos países vizinhos, vendo limitado o seu acesso a serviços básicos e ficando mais vulneráveis a exploração laboral e sexual, tráfico, discriminação e violência.

— Em todos eles, a pandemia e as medidas implementadas para travar a propagação do vírus agravaram a já precária situação, ficando estas pessoas sem acesso a serviços vitais e sem capacidade de assegurar necessidades básicas. Grande parte das pessoas migrantes têm trabalhos informais nos países de acolhimento, que não permitiram a sua subsistência com a chegada da pandemia.

— Em situações extremas, surgem alojamentos improvisados e temporários, como é o caso de La Pista, um antigo aeroporto na cidade de Maicao na Colômbia, feitos com lata e cartão, sem acesso a água potável ou saneamento básico. Muitas pessoas vêem-se incapazes de alimentar as suas famílias, levando muitas crianças a casos graves de subnutrição. Algumas ONGs dão apoio alimentar a famílias nesta situação, mas muitas pessoas fazem apenas uma refeição por dia à base de farinha e, ocasionalmente, arroz.

— A Venezuela era um dos países mais ricos da região e, apesar desta crise ser a maior na história da América Latina e de já ter sido equiparada à crise humanitária na Síria, ficando em segundo lugar no que respeita ao número de deslocados internos, recebe muito menos apoio financeiro — cerca de 10 vezes menos. A maior parte dos países de acolhimento são países em desenvolvimento e, sem os fundos necessários para fazer frente a esta crise, as consequências serão devastadoras.

— Em fevereiro de 2021, a Colômbia, que acolhe cerca de 1,7 milhões de venezuelanos, anunciou que iria garantir 10 anos de proteção subsidiária a venezuelanos a viver no país que tivessem chegado até ao dia 31 de janeiro, independentemente da sua situação legal, garantindo-lhes acesso a saúde, educação, emprego e, a longo prazo, obtenção de autorizações de residência e nacionalidade.

— Sem resolução à vista para os problemas que afetam a Venezuela, estima-se que o número de pessoas migrantes e refugiadas venezuelanas na Colômbia continue a aumentar. Por sua vez, a Colômbia atravessa também uma crise política e económica que força muitas pessoas a abandonarem as suas comunidades. No final de 2020, havia mais de 260 mil pessoas refugiadas e requerentes de asilo provenientes da Colômbia espalhados pelo mundo e mais de 8 milhões de deslocados internos. A situação colombiana tem-se agravado devido à pandemia e à crescente violência por parte de grupos armados que restringem o acesso a apoio humanitário por parte da população. As comunidades indígenas e afro-colombianas em zonas fronteiriças têm sido particularmente afetadas.

— Em números mais reduzidos, mas igualmente preocupantes, outros países da América Latina reúnem esforços para tentar dar resposta a esta crise que lhes bate à porta. Dados de 2020, indicam que o Peru acolheu mais de 1 milhão de venezuelanos que abandonaram o seu país, tendo aumentado o número de migrantes no país 82,3% comparativamente ao ano anterior. As necessidades gerais da população aumentaram também, no que diz respeito ao acesso a comida, cuidados médicos, água potável e cuidados de higiene, documentação e proteção de mulheres grávidas, pessoas com deficiência e crianças não acompanhadas ou separadas das suas famílias.

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— No Chile, os venezuelanos representam o maior grupo de pessoas migrantes e refugiadas no país, que são as mais afetadas pela pandemia devido à ausência de proteção social. Está prestes a ser aprovada uma nova lei que permitirá o acesso a 13 tipos de autorizações de residência temporária, ajudando a regularizar a situação de muitas pessoas. No início deste ano, verificou-se um aumento nas chegadas através da fronteira com a Bolívia.

— No Equador, a pandemia aumentou a dificuldade de acesso à educação de crianças venezuelanas. A ONG World Vision Ecuador solicita às autoridades do país que garantam os cuidados de saúde deste público; a implementação de ações concretas para proteger os seus direitos e a regularização do seu estatuto de imigração, garantindo as medidas administrativas necessárias durante a sua estadia no país; bem como apela a que se evite o despejo de famílias migrantes que não tenham capacidade para pagar a renda.

— O Brasil atravessa uma situação frágil no que diz respeito ao combate à pandemia, sendo um dos países do mundo com maior número de mortes. Embora as fronteiras estejam fechadas desde março de 2020, continuam a chegar pessoas migrantes e refugiadas por rotas não oficiais. A falta de documentação pressupõe uma grande dificuldade a encontrar trabalho e o acesso a serviços públicos, deixando famílias venezuelanas muito mais vulneráveis.

— Nas palavras do Alto Comissário para os Refugiados, Filippo Grandi, “Inclusão é a nova proteção”. Referindo-se ao contexto migratório a nível mundial, afirma ainda que “por trás de cada número, está uma pessoa longe do seu lar e uma história de fuga, desenraizamento e sofrimento”. É urgente encontrar soluções que ponham fim a esta situação.”

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[Fotos: Schneyder Mendoza Fotografía, Nadège Mazars, Jon Warren, Ivan Valencia]

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